February 10, 2007




A Casa dos Bach


Chove torrencialmente no texto. No descampado, correm ribeiros exigentes e momentâneos. Atravessam e encharcam a rua e arrastam-na para o Elster que atravessa Leipzig, e corre apressadamente para o Elba. São informações da imaginação sobre um mapa. Sobre o texto, chove torrencialmente. (...) Fora do abrigo, só avança o silêncio da água. O texto vê-o descer do alto debruçado sobre as águas. (...) E o texto não vai escrever sereno "no princípio era o verbo"

na esperança de que tudo volte à proporção equidistante. (...) O texto avança e apaga o desenho das águas (...). Eu, que escrevo, disse ao texto é agora, a hesitação não ilude! O texto-Pégaso fincou os cascos no descampado, lançou as suas asas para proteger a casa que desenhara, abarcou com os olhos o rio cansado de excessos e escreveu, bem alto, fico aqui!, ou o silêncio da água se incorpora no rio, ou o meu desenho é uma simples metáfora.

Passaram horas, a noite caía em bátegas sem parar, cobria e prolongava, de igual modo o declive do monte por onde correm o cavalo e o rio, à beira da casa. O efeito de esperar adensa a noite, parte da muralha da cidade já soçobrou, há pontes sobre o Elster à tona de água mas, aos poucos ergue-se uma luz trémula de aurora que balbucia palavras, ainda ininteligíveis (...)


Este é o texto


que nunca se esquecera do modo como se formou a imagem da água para o seu próprio nome (...)


Llansol, Lisboaleipzig 2. O ensaio de música, pp.42-44